quinta-feira, 10 de dezembro de 2009

Toda Estupidez Será Castigada

(Ou crônicas à volúpia da gema)

...porque adoramos pisar em ovos.
Sim, veramente. E isto é fato inconteste, apesar de inconcebível. Digo-o, de fato, porque adoramos pisar em ovos; e quando, por fortuna do acaso, vez ou outra conseguimos pisar em terras firmes, nos sentimos mal e debilitados (um truque torpe de nós contra nós mesmos, mas tudo bem); ato contínuo, abrimos mão daquele piso demasiadamente brando: Porque adoramos pisar em ovos.
Talvez seja pela casca, tão frágil e incerta. Ou quem sabe pela gema, que explode lentamente apregoando-se em nossas pernas e causando mal cheiro, de maneira grudenta e de deveras difícil reparação (é necessário lavar bastante). Numa terceira hipótese, ousaria arriscar que talvez seja porque quando nossas pernas (bem como o restante do corpo) acabam marcadas quase definitivamente pela massa viscosa formada pela casca frágil, pela gema fértil e por eventuais pedaços de carne provenientes de nosso corpo dilacerado no decorrer do percurso (o que se aplica mais especificamente àqueles que permanecer no trajeto dos ovos por um longo tempo) sentimos uma sensação dolorosa de vida, não sei.
Eu sei: é que adoramos pisar em ovos! E no final das contas, a terceira hipótese, a mais triunfal e cênica de todas, nos possibilita a chance e arrancar à unha toda aquela massa amorficamente enraizada e preparar uma espécie de omelete vital que às vezes digerimos à contragosto, às vezes não.
Bem como as nossas, os ovos são meras aspirações de alguma vida, que sempre acaba pisoteada, porque adoramos pisar em ovos. E então aqui as coisas se juntam e conseguimos chegar a um ponto de convergência. Meu peito agora solta um aperto; e isso é fato. Como também é fato que não sei dizer se ele é consequencia do almoço que não fiz no dia de hoje e do cigarro artesanal que me incitou diversas tosses no primeiro trago, ou se são apenas os primeiros vestígios dos outrora ovos, que agora perdi de vista, talvez por estarem bem abaixo dos meus pés, ou bem acima do meu peito.
Ressalto que isto não é uma metáfora. Ou é. No mais, pode ser tanto uma coisa quanto outra. Como bem pode ser nenhuma delas. Poderia, por exemplo, ser uma metáfora à ditadura que nunca vivi. Mas não é. Como bem poderia ser uma paródia à crise do prédio de piso azul no centro da esplanada distrital. Mas não é. No final das contas tratar-se-ia apenas de um breve relato sobre o incomensurável prazer humano de pisar em ovos. Com a ressalva de que o pronome não determina nada, mas o “ia” diz muita coisa. Diz inclusive que ia, agora não vai mais.
Talvez trate-se apenas de lançar palavras soltas sobre o que não conhecemos (nosso “verborragismo” atávico). Ou, de lançar palavras certas sobre o que conhecemos mas não deliberamos (culpa da nossa (in)competência emocional). Mas eu havia feito menção ao “ia” (da mesóclise) e por conta dele me sinto na obrigação de encerrar este discurso. Por detrás dele há uma série de discursos sustentados sobre uma absoluta instabilidade. Nada ainda é certo e só o que eu sei até então é o evidente: que nós adoramos pisar em ovos. O tremendo mal cheiro que causam me traz enjoo, mas ainda não sou um Grande Ser Tão capaz de me safar imune. O antídoto que me resta é me vestir com as alpargatas do verbo para tentar sair um pouco ilesa (os cortes estabelecidos pela casca doem como nunca e já me renderam uma cicatriz numa das pernas).
A volúpia da gema me causa espanto e loucura, mas é a casca aparentemente frágil e incerta que acaba por me causar as piores cicatrizes, por dentro.

segunda-feira, 30 de novembro de 2009

A Fugitiva

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(ou qualquer um dos outros 06 títulos possíveis)
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"A Senhorita Albertina foi embora"
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Pouco menos de 45 dias, esta minha obsessão por Proust. As coisas acabam sempre fazendo sentido, numa hora ou n'outra. E neste momento, em específico, me sinto extremamente feliz (entra Tchaikowski com seu "Quebra Noses", pra ilustrar este momento tão único e singelo). Declaradamente me entreguei às sinestesias, redescobri o Violoncelo de Pessanha há cerca de dois meses e encrustrei-o na pele - as coisas sempre acabam fazendo sentido, numa hora ou n'outra.
Mas eu não ia falar de Pessanha, nem das sinestesias, tampouco do Violoncelo, apesar de estar mais dentro da esfera poético-musical do que nunca. Consegui, enfim, em fato e em ato unir a Poesia e a Música num só ofício em minha vida, pelo menos pelos próximos dois anos (ápice da valsa tchaikowskiana - eu poderia usar o termo técnico, mas sinceramente não o sei - é que meu objeto atual é música popular brasileira, parodoxalmente atual e distante).
E então eu não ia falar de Pessanha, nem das sinestesias, nem do Violoncelo... Mas sim do meu momento atual, confuso e empírico, talvez isso explique um pouco minha obsessão por Proust. Algumas coisas aconteceram depois que pisei em território sulista. Dentre elas, o fato de descobrir o tão procurado livro do pequeno capítulo de sensações angustiantes que li certa vez em francês e jamais consegui descobrir a autoria (me poupei de dar crédito ao autor, excluindo as últimas folhas da foto-cópia pra pagar mais barato). Mas depois desatei uma corrida alucinante - sabe-se lá quantos dias à procura da obra. Para auxiliar-me na empreitada tive a doce colaboração do meu antigo amigo, inexistente leitor e atualmente sem uma posição específica em minha vida - o fato é que eu realmente gostaria que ele soubesse que descobri do capítulo a autoria. Mais que isso! Adquiri o livro. Edição antiga, como de praxe. Negociada, mais uma vez, na biblioteca para a qual já verti um sem número de "Códigos da Vinci" em troca de raríssimas edições de clássicos. Passo a aclarear as coisas. Eu procurei durante dias, meses, horas a fio na biblioteca e madrugadas (madrugadas?) a fio daquele meu amigo, especialista em buscas virtuais, para as quais eu tenho me rendido recentemente. Então um belo dia, no meu doce e pacato habitat natural de 8 mil habitantes, procuro Camus na biblioteca municipal e encontro apenas uma obra: "O Estrangeiro" (talvez Wagner caísse melhor nesse momento). Mas é claro! (e óbvio). Abri a primeira página e me tomou de volta aquela sensação angustiante de 2004/2005 em que cursei aulas breves de francês - era acabada a estória, da minha busca deseserada, na companhia agradável de meu amigo, pelas letras que deram início talvez à minha primeira consciência da angústia profunda (eu daria outro adjetivo, mas me falta sensibilidade para tanto, por ora).
Troquei-o, como outrora dito, e fui pra casa sorrindo de lado, cortando transeuntes para me "enfurnar" no meu quarto. Depois segui viagem... para o cerrado, depois para a "transamérica de áfricas utópicas", e por fim cheguei na Ilha, trazendo-o não na mala, mas no bolso - um excelente companheiro de travessia, diga-se de passagem.
O que isso tem a ver com Proust?
Não sei. Talvez com a minha constatação atávica de que as coisas demoram um tanto pra chegar a consciência. A não ser que o caminha seja inverso - da consciência para a nossa esfera sensível. Mas quando o caminho é o verso, por si só, ah (pausa de semibreve)... haja madrugada, lua, (ex)tragos, enfim.
Portanto diria que, embora tenha consciência do efeito letal do Proust no meu momento atual, não me sinto ápta para discorrer sobre tanto. Poderia até me precipitar e expressar simplesmente que me encontro atualmente perdida no poema de sete faces anterior a Drummond (meu amigo agora talvez sorrisse, com um ar de "apenas eu entendi"). A anagnórisis, hermatia e perepetéia têm me feito sentido como nunca, no movimento trágico desta minha leitura.
Mas acontece que as horas me chegam e é chegada também a hora de dar cabo à minha narrativa - introspectiva e egocêntrica. Culpa dessa minha mania de divagar sobre o espectro existencialista. Muito embora talvez aqui haja muito mais essência do que existência, em si. Ou talvez seja só a maresia entorpecente dessa travessia... em rio longo e cheio de fumaça, mas de diversas notas, sempre de diversas notas.
(Apoteose de meu Allegro em Si, Bemol).

segunda-feira, 12 de outubro de 2009

O Desescrito

(ou o que provavelmente será em breve apagado)

Hoje pela madrugada ouvir um disco bom me fez querer "beijar a boca da noite", fazer com ela qualquer coisa absurda num ato libertino e impuro - mas livre! Não ousaria usar demais descrições pela discrição mesma que cobre o pudor que envolve esta minha redoma - de óleo ou de ácido; mas de fina casca, sempre fina casca.
Há tempos não encontrava a madrugada tão nua assim para mim como por ora - pouco importa o ponto expediente que me espera amanhã no horário sempre atrasado; arrastado. Hoje quero apenas a madrugada - adentro ou afora, não importa a direção. Hoje pretendo ser o foco da ação, ao mesmo tempo me sinto pacificamente agente, não sei.
Estou mais para música do que para poesia, nesta noite.
- Inacreditavelmente, estou mais para música do que para poesia, esta noite!
Ou talvez a poesia em forma de música tenha me feito prescindir um pouco das palavras e preferir, do contrário, trocar meu "mizinho" arrebentado na tentativa frustrada de entoar uma nova bossa. (ou bossa nada nova, tanto faz)
Eu trocaria meu "mizinho" agora e tentaria reproduzir o Drama que agora ouço.
Não estou dada às palavras, fato que soa demasiadamente claro na minha narrativa e que me entristece, de certa forma. Habito no verbo - bem sei. Ora pois.. ele não tem culpa de ter nascido insculpido na fôrma - e nem eu.
Mas talvez hoje eu esteja mais para música pelo simples fato de entender bem menos de música do que de verbo, talvez. Digo por estar sempre mais para sentimento - esta expressão máxima do meu analfabetismo. (sorriso meu, de lado - repetindo pra mim mesma a sina desta minha mania insólita de alforria - de quê, senhor, de quê?); enfim, talvez isto explique um pouco as coisas.
Apesar de viver graças à cadência triste e cansada da caixa acústica do meu peito hoje pretendo adormecer pedindo que me volte o verbo... (por que eu quereria?)
Dormirei entre as notas: mergulho notívago no universo pautado da escala diatônica - no verbo ou na música ainda não consegui me livrar deste ocidentalismo atávico.
Arriscarei alguns acordes dissonântes para ver se o verso brota.. se o verbo vem. Evitarei ao máximo a droga da rima de mera conexão acústica, tão enrustida na nossa mente pela indústria fonográfica indecente destes tempos de cólera.
(se aqui tivesse um espaço pautado talvez eu me saísse melhor nesta lamúria de hoje)
Silencio, por ora. O som depende do silêncio. O verbo também. Às vezes - e no mais das vezes - um suspiro diz mais que meia dúzia de palavras; mas acontece que ninguém conseguiu descrever ainda ao certo esta onomatopéia.
Onomatopéicamente me despeço -
(pausa de mil compassos)
Partirei em silêncio a procura do estribilho que deixei cair em algum lugar obscuro ao adentrar incisivamente esta noite.

segunda-feira, 14 de setembro de 2009

Do lirismo e da gravata

&
(ou, sobre a meta-equação)
§
Estive pensando, qualquer dia desses, sobre o prazer incomensurável que sinto em minhas aulas de história da música, das agora doces tardes de quarta-feira...A matéria é espetacular e a professora (se tudo correr bem, doravante orientadora) fantástica, os alunos interessantes e o material sonoro que descubro sem valor estimável. E então, durante uma aula sobre os “Chorinhos e Chorões”, pus-me a pensar na minha relação com a música. -
Presente em minha vida desde a placenta (bônus de todo filho de musicista) sinto a música correndo em minhas veias desde o despertar de minha consciência pra vida. A esta altura, inclusive, minha mãe já até havia trocado as aulas de corda pelo cotidiano de ponto expediente (e pelo casamento, pelas filhas et coetera). Para minha alegria, anos antes de eu assumir minha paixão pela música, pelo amor ou pela dor minha mãe retomou seu ofício (sem casamento e com filhos crescidos, mas esse é só um detalhe). Evidentemente achei belíssimo! Tanto quanto hoje manifesto o meu horror ao ponto expediente – como as coisas mudam. Com 0 06 anos de idade, quando passava a tarde nos ensaios dos concertos de minha mãe, passava o dia todo decorando os termos tão belos da Constituição (- as coisas realmente mudam). Hoje, nas aulas sobre a constituição, me distraio (e des-traio) com um joguinho de notas bem divertido, que pode traçado resumidamente em “tom tom semi-tom tom tom tom semi-tom”- pra toda e qualquer escala. Mas isto não é uma auto-biografia; e nem haveria de ser. Passemos então a falar da minha relação fisiológica com a música, enfim.
Nunca gostei de estudar teoria! Regra geral, de nenhum tipo. Tomem que meu professor supremo de gramática foi Machado de Assis, ora pois. Também assim se deu com a música. Seguindo a máxima de que “em casa de pedreiro o espeto é de pau”, nunca fiz aulas de música com minha mãe, sequer quaisquer reles retiradas de dúvida. Aprendi, por culpa do maldito ponto expediente, a brincar com o violão bem cedo, antes de completar minha primeira década: tentava decorar o caminho dos dedos de minha mãe nos encontros de amigos e família e depois repetia no quarto. Um misto de amor e curiosidade. A falta de menção à técnica não é proposital – é fática!
E penso que assim é que se dá, com quase tudo na vida. Aprende-se a ler, lendo.. a tocar, tocando.. a escrever escrevendo.. ou amando.
(síncopa)
Peço, por gentileza, aos Senhores que não procedam à uma conotação caramelada da frase anterior. O verbo, como diria Clarice, “chora piegas”, bem sei. Mas há que se considerá-lo em todas as suas acepções, concepções e contextos. E é outra coisa que se faz quando se está no palco? Amar é um instinto, creio. Ama-se sempre, sabe-se lá o quê! O importante é apreender da sensação o devaneio, a mola propulsora da arte. No mais, traz algo do tipo Carlos Drumond de Andrade, “Eu não queria dizer, mas essa lua, mas esse conhaque...”, enfim.
(risos) - Conversa de boteco (com o), às cinco e meia da tarde de uma sexta-feira em que eu vou dar aula até às onze da noite.
A síntese é que entre encontros frequentes e uma centenas de textos (que pela primeira vez me aparecem simultaneamente obrigatórios e úteis) esta aproximação com a música tem me feito bem. Tanto minha rotina quanto meu verbo se tornaram menos ácidos (Ao que pergunto - E isso é bom?), sob a pena de uma quase insuportável pessoalidade. Por falar nela, e em razão dela, não pretendo me estender aqui - dormi pouco e apesar de não sentir nenhum sono preciso digerir em silêncio o DVD de um show que assisti ontem e que duas ou três palavras de um encontro casual me fizeram enxergar deveras melhor do que até então. É bom não ter de pesquisar jurisprudência para criar um juízo de valor a respeito de uma obra - e do contrário senti-la assim.. sentindo. A mecânica (líquida, livre e volátil) é a mesma do início. O bom é ser substância, mas eu ia dizendo que odeio a pessoalidade. Abaixo à primeira pessoa! Dizia ela (sobre a equação):
"A gravata, realmente, sufoca e constrange o pescoço. Mas são essas doses insuportáveis de lirismo que causam sempre qualquer desesperado nó na garganta".1
1. Ela, a gravata.

terça-feira, 4 de agosto de 2009

Do Ritual do Grau de Mestre do Átrio na Ordem Templária de Portugal

("E assim vêdes, meu irmão...")

Arre! Eu e minhas verdades de neófito..
Vejam, Senhores, que cá estou eu novamente para repetitivamente tratar de lamentações - e ações. Ora, mas como haveria de ser? Com a alegria lanço-me à noite, ao ópio contemporânio, às imbecilidades mais sutis de quem acorda com doses exorbitantes de endorfina - o que é ótimo e nada imbecil, mas preferi dizer assim (Não! Nenhuma menção ao meu amigo da távola labiríntica deste escritório). Ocorre que meu sentimento típico é outro e é quando ele brota que cá despenco - Se escrevo é poque preciso.
No mais, nenhuma novidade. Tenho pensado sobre o quanto tudo retorna - sempre e tanto. E eu em meu paradoxo eterno e bipartido entre a poesia e a gravata. Ah, Senhores, não me venham pois falar em compatibilidades! Forma se diferencia de fôrma - bem sei. Mas ocorre que o exercício crônico e eivado de ponto expediente nada se assemelha com exercício libertário de quem respira pulsação e substância (de novo, o polvilho - e aqui peço licença para fazer menção à única junção perfeita entre gravata e Substância; mas a gravata era borboleta, do meu amigo contador de Estórias).
Vá lá, a inspiração pode brotar do cotidiano forense, às vezes. Contudo, sempre sobrecarregada de tédio. Não, não.. não abrirei mão desta sina - "mi piace", entendas. Cada um com suas idiossincrasias - e asias. E eu me deleito entre as causas e códigos, particularmente sinto falta de exercitar um certo "raciocínio jurídico". Mas a causa maior é a vida, para a qual não há tribuna. Perde-mo-nos entre tribunais de excessão que nos são interpostos frequentemente; e cada um que justifique este fato com suas próprias crenças - minha fé é fé menina, mal sei. A verdade ou inverdade das coisas reside no fato de que pra quase tudo existe uma boa metáfora; aquém ou além de doses exortadíssimas de intertextualidade. O sub-título da narrativa tem continuação e um fim nada pontual, segundo o qual "são, ainda que opostas, a mesma verdade".
Eu e minhas verdades de Neófito...
Permanecerei, pois, imersa ainda nelas, Senhores, "S'il ma plait"!
E agora deixe-me retornar à gravata: depois destes breves minutos de poesia de meu café au lait.

sábado, 25 de julho de 2009

De Pessoa a Machado

(e vice-versa)

De que nos valem nossas intrépidas viagens, quando o que se busca é, verdadeiramente e ao cabo, a si mesmo?
Paisagens diversas cá de fora nada ensinam sobre as dores mais profundas da alma.
Percorro, lenta, a maré cansada dos meus sonhos -
Não há remédio para as angústias da alma, para as quais o melhor antídoto é antes a pena da galhofa
Ou o tinteiro
Ou o palco
Ou nem um, nem outro
Vá lá! Cada um que seja seu auto-boticário e encontre para Si (ou Mi) o melhor remédio.
E o amor?
Ah, essa invenção do contemporâneo.
O espelho está em tudo, Senhores.
Prejetamo-nos desde aos refletores até às coisas e pessoas. O Ser-em-si não basta. Precisa ser para-si. Ou, no mais das vezes, para-outro.
Talvez essa indagação heideggeriana explique as tendências bizarras da moda.
Poderiam, então, "modificar" os cérebros, ãh?
Seja europeiamente, a la James Joyce. Ou tupiniquinense, a la Carlos Drummond de Andrade.
O que me entristesse é esse vazio - que está em tudo (inclusive em mim).
Por outro lado, se eu fosse fã do Justin, talvez eu fosse feliz.
Retórica de quinta! A metafísica é só uma consequencia de estar mal disposto -
Eu sei. Eu sei. Eu sei.
Talvez seja a lua, quem sabe o não-conhaque.
Ou as vinte horas de viagem e de reflexão intensa (fuga proposital de meu companheiro de poltrona que adora fazer "novas amizades"). Acabo de me sentir um Casmurro, mas acontece que a narrativa está mais pra Pessoa.
E assim, retornando ao casulo dessa persona, retiro-me para comer chocolates.
Adeus, Senhores! A gran metafísica do mundo me espera.

sexta-feira, 10 de julho de 2009

Dos males...

Ah, se os males da alma fossem tão curáveis quanto os do corpo...
O que mata, senhor, é que séculos passam e a história é a mesma: sequer um antídoto, quiçá temporário. Das físicas e da física nada se tira que possa agir em proveito do ânimo (sim, de anima, bem mais incisivo que alma, com a licença de nosso Português). Mas, em todo caso, mudam-se os nomes, renomes, CIDs e até mesmo demônios na era do pluralismo religioso - tudo para o quê no fundo é explicável por uma simples patologia crônica: o imenso tédio angustiante de viver. E por que eu não me mato? Ah, vá lá, senhores! Com vossa licença, me viro muito bem: com tragos, discos, livros e tudo de poético que a vida tem. O mal não está no mundo, enfadonho é o ser humano - Ao que pergunto: Se são malíficos os atores da peça, também em conjunto padecerá a beleza do canário? (...)
Aprecio as belezas da vida! Acho paisagens solenes, poesias belas e aprecio com moderação minhas viagens sem roteiro, físicas ou metafísicas. O problema consiste em olhar pra dentro (Chamo Pessoa:) _ "Porque, de tão interessante que é a todos os momentos, a vida chega a doer, a enjoar, a cortar, a roçar, a ranger, a dar vontade de dar gritos, de dar pulos, de ficar no chão, de sair para fora de todas as casas, de todas as lógicas e de todas as sacadas e ir ser selvagem para a morte entre árvores e esquecimentos...", enfim.
Acalmem-se todos, senhores! É só um estado de espírito. Acontece que hoje ao acordar e olhar para o mundo senti tudo enfadonho. Amanhã pode ser diferente; e assim tenho crido todas as manhãs, desde a primeira em que respirei a consciência de existir!rs
rs... Ah, saudosa ironia! Salvaste Kieekiegard da forca e levaste Nietzsche à loucura(...). Eu e meus filósofos, deixe-os cá! Por que haveria eu de citar políticos ou jornalistas ou artistas ou a última loirinha fútil e pop de holywood ou o último jogador de futebol másculo, milionário e acompanhado desta mesma loirinha, a citada anteriormente?
Ah, maldade! A ti não me entrego. Mas não posso me furtar a rir dessas vicissitudes da vida. O contingente sempre acima do necessário - Viva o Ronald (o filho do Ronaldinho ou o Mc Donald) e todas as criaças subnutridas africadas esmagadas pelo neoliberalismo (estampando desde a minha calça jeans até o meu notebook, de onde posto esta lamúria de agora).
Mas enfim... eu estava falando dos males da alma - e voltarei a eles - (Vem, Pessoa!): "Come chocolates, pequena; Come chocolates! Olha que não há mais metafísica no mundo senão chocolates.Olha que as religiões todas não ensinam mais que a confeitaria. Come, pequena suja, come!" -
E assim agarro eu minha barra de chocolates da "blá blá blá S.A" (aquela, da indústria, do cacau e dos trabalhadores imundos em condições sub-humanas que provavelmente ajudaram a extraí-lo - Lembrei Gullar, com seu "Açucar".rs) e caminho de volta pra casa.
- Ainda sonho descobrir a rara fonte provedora da cerotonina da vida!

quarta-feira, 1 de julho de 2009

Para cada página, alguma boa dose...

Eu e minhas dolores...
Prefácio antigo e batido, remonta aos vagos tempos - mas vamos às lamentações!
Estive pensando sobre as cores e os esquimós (talvez alguma outra civilização da qual eu não me lembro o nome), mas fiquemos com os esquimós. Nenhuma relação com a estação, tampouco com qualquer boa notícia monocromática. A relação consiste basicamente numa informação antiga e não muito confiável, mas que desde de então vem me servindo, às vezes como metáfora, às vezes como lição, não sei. O fato é que um "disseram" bem indeterminado me passou a informação de que os esquimós enxergam cerca de cinco ou seis tonalidades da cor branca, de maneira contrária desconhecem algumas cores ocidentalmente corriqueiras, como o verde, o amarelo, enfim! Da sorte que eles enxergam um número muito pequeno de tons, perto do que enxergamos e, aqui reside a genialidade, tudo isso se explica pelo simples fato de que desconhecem completamente todas as outras (as cores).
Tal constatação, inicialmente simplória e precária, remeteu-me a uma angústia crônica: por que raios um dia eu invadi o silêncio do meu dicionáro para ir ao encontro do vocábulo "nostalgia"? Que ficasse eu com os analgésicos, amando-os pelo alívio instantâneo sem sequer imaginar o tamanho do leque que abrange a raíz de sua significação, ou significações. Tamanho é o prejuízo que nos é causado pela linguagem - eis, então, o verdadeiro poder do verbo!
Lembrei-me da bíblia; e do Famigerado, de Rosa.
Depois, adentrei a substância específica (aos que acompanharem meu raciocínio, não me refiro ao polvilho) e recordei Ulisses; o do Homero. E de algum outro livro do Kundera, que não é Rizíveis Amores e nem a Insustentável leveza do ser. Por fim, caí incisivamente sobre a vertigem de tudo o quanto se nega a cada ano a abandonar minha mente, Era Ela.
Colecionar saudades - talvez seja um exercício. Mas a nostalgia não cabe em significação alguma; e nem dentro do peito. Explode, frequentemente, em tragos de conhaque - mas deixemos pra lá esse lirismo.
Eu volto a falar dele, vem tudo no terno e eterno retorno (Ah, Friedrich!). E então recordo Nietzsche; e algum outro livro, talvez também do Kundera. Tenho vontade de ler tanta coisa, mas carrego uma biblioteca vasta em minha mente, o que me traz a sensação de ser de um arcabouço empoeirado (essas velharias todas).
A palavra me remete à lembrança, que me remete ao peito, que me remete à origem, que me remete ao leito (o qual ainda nem encontrei).
Eu hoje continuo buscando o dicionário, mas ao invés de ir ao encontro, prefiro investir de encontro ao vocábulo nos-tal-gia - maldita combinação greco-roma que cospe essas doses insuportáveis de lirismo no seio da América Latina.
Mas, para a minha alegria e de tantos outros (os perseguidos pelo vocábulo), há sempre contra qualquer dicionário um bom catálogo de destilados. E, por falar nisso, esta narrativa anda lírica demais, preciso perder (ou ganhar) mais tempo na página da "Ironia"... seja na do dicionário, na de Kieekiegard, ou, invariavelmente, na da minha própria vida -
Entorno o eterno retorno - Até!

quinta-feira, 18 de junho de 2009

Há mais mistérios entre estes 299 km do julga nossa vã filosofia...

Prezado amigo (a quem as letras e uma certa quarta-feira furtaram o status de estranho),

Hoje o dia amanheceu tão enfaticamente cinza que, mesmo depois de dormir horas a fio, ainda me toma fortemente as pálpebras alguma sensação pesada de sono, ou de cibemol rouco... entoado por uma gaita cansada, não sei. É fato que ainda venho me acostumando com esta nova (velha) vida, além do mais o contraste incisivo entre esta cidade sulista provinciana e o sol do meu antigo Cerrado tem me trazido como síntese sabe-se lá quantos aglomerados de sensações (da maneira mais plurificada possível!). Mas, depois da ousada intimidade firmada pelo apreço etílico, eu não cometeria jamais a audácia de me meter a falar de "setires" - esqueçamos o cinza e o cibemol da gaita, passemos às anormalidades.

Julgo que há sim neste nosso "reino de cartas" alguma dose salutar de insanidade. A nossa proximidade, ainda que não geográfica, certamente firmou-se sobre algum viés de excentricidade que nos une, n'algum ponto - e, insisto, - n'algum conto. Mas eu também não quero falar de rimas.. elas grudam, pregam-se na pele da língua aprimorando as papilas gustativas para as impressões mais intensas sobre a vida. Há também as vezes em que brotam feito praga, tornando tudo pifiamente reproduzido sobre o prazer barato da mera conexão acústica ("se eu me chamasse Raimundo seria uma rima, não uma solução").

As palavras pegam e infectam a quem padece (ou se compadesse) por elas... e nós sabemos bem disso. Irrenunciável, irretratável, e inalienável - como as rimas conspiratórias que nos acometem nos dias de chuva. De rima em prosa ou de prosa em rima a gente monta uma valsa, ou uma sinfonia bethoveniana, dependendo do tamanho de nossa tempestade.

Mas acontece que hoje o dia amanheceu todo cinza e eu bem suponho que ainda virá uma carga de chuva. Deixemos a tempestado, não quero antecipar sensações. Recolho-me então à frieza do cebemol entoado pela minha gaita rouca. E ao som mudo destas palavras, adoráveis pontífices desse nosso "reino de cartas".

segunda-feira, 15 de junho de 2009

Das autópsias...

(onde o radical auto - anote-se - possui tamanha e notável importância)

“É como se diz nas autópsias: o interno não aguenta tinta” - mal engolira a seco o café amargo de meu mais um dia desses e já recordava a prosa machadiana. Não, nada disso. Não quero parecer magister em interpretações equivocadas, todavia, caríssimos, de antemão e prontamente esclareço que não se trata de nenhuma retórica bem elaborada de algum Dr. OAB 0000-0, enfim. Trata-se, antes, de prova fática e talvez iletrada, quiçá realmente doutora – não se sabe! - já que se trata de carne fria, congelada a sabe-se lá quantos graus centígrados num freezer nada aconchegante. Que me desculpem aqueles a quem eu causei decepção ao dizer que não trato – e relato – aqui o estado estático do presunto que recheou meu pão francês no café da manhã deste dia (até porque reneguei aos hábitos carnivoros há um tempo – e por um tempo – e também não costumo acordar a tempo de dirigir-me à padaria para esse tipo de deleite matinal – sim, o tempo também está em toda parte). Trata-se, presados, de carne humana: esta, essa e aquela que em alguns lugares do mundo, inclusive n'alguns da terra brasilis, serve de comida aos abutres e que mostrou-se à minha frente nesta manhã de segunda numa visita ao Instituto Geral de Perícias. Ora, ossos (e, aqui, para todas as acepções) do ofício! - vulgo, aula de Medicina Legal. O universo parecia mais suave no Mundo das Letras, digo, o do meu tempo de antiga graduação. Ou não! - penso. Tudo o que é ato humano sangra, de alguma forma. O salto se deu apenas para uma esfera mais concreta. E assim parti eu em minha sina, ora vá-sina, acadêmica - desde as salas de análises de identificação mais simples até o cheiro de formol. Lá o “arquivo morto” não encontraria nome mais cabível. Tudo cheira a gelo e frieza e não se vê muitas manifestações do que se conhece por vida. O que separa o ser humano de uma máquina é, hoje em dia, quase nada (exemplifique-se com as bonecas de criança com semelhança semi-viva ou com os bonecos de dublagem ou de simulação). Ressalto aqui que ainda não entrei no mérito do aspecto cognitivo (ou interior), até porque, retomando Machado, o interno realmente não aguenta tinta. O corpo, contudo, mostrava-se ali, duro, mas com cor, brilho opaco e com muito mais massa corporal que muitas das crianças que me apareceram ontem num documentário sobre o Zaire, vá lá! E assim, retomo, a única diferença entre aquele, no freezer, e os outros, o médico legista e os os companheiros de sala, era, sem dúvida, a existência/inexistência de movimentos e funções vitais. Talvez, numa parte mais..., digamos bem simplóriamente, “profunda”, o cara do freezer estivesse muito mais vivo que tantas outras pessoas aqui de fora (não quero falar sobre o “aqui de dentro”). Sendo assim, e por fim, a ausência de vida se dava, na sala, pela falta de cor, de calor, de céu ou sol, quem sabe de uma vegetação colorida que não demonstrasse cores tão opacas quanto as de uma natureza morta (essa já várias vezes pintada e certamente pendurada em diversas paredes desse mundo).
Não sei se quero escrever sobre isso! É enfadonho e cheira à morte e eu não pretendo lançar mão do tinteiro e encenar um Brás Cubas do terceiro milênio. A morte se dá de várias formas. Morre-se todos os dias, de uma maneira ou de outra. E eu, que contrariando Aristóteles não sei se pretendo ser imortal tanto quanto me for possível, preocupo-me antes com o desejo que às vezes me bate de fugir do (com) gelo interno, seja com um copo de wisky, com um trago de Rosa ou postanto este relato funesto aqui. Por fim, deixo claro que também não pretendo cheirar a Bukowski. E, não final das contas, espero também não ter conduzido ao (com) gelo nenhuma alma encalorada que teve má fortuna de se aventurar nesta narrativa – tão fria e áspera quanto o indigente desprovido de vida que conheci nesta manhã, de segunda. As finalizações reiteradas são propositais, já que o texto trata de finitude e angústia (que venha Kieekegaard!). Se bem que não sei ao certo se existe metalinguagem para a morte. Assim, sem mais (linguagem ou meta), eis o fim!

sexta-feira, 12 de junho de 2009

Dos Porquês...

Sim, senhoras e senhores..
Considere-se esta uma data de redenção. Não, absolutamente (sim, em ênfase). Nada relacionado com (mais um) dia do marketing, cujo subtítulo aplicado compreende os dizeres "dia dos namorados". Considere-se a data e a redenção relacionadas antes - e apenas - aos porquês (vide o título) que me conduziram à criação deste espaço. Por muito tempo resisti às inovações e revoluções tecnológicas. Mas hoje minha resistência consiste sobretudo na preferência da vitrola sobre o Ipode, da câmera de filme sobre o Mp3245..., do meu Uni Mille 1994 sobre todos os auto e aeromóveis do mundo e, mormente, do lápis-papel-borracha (outrora "pena da galhofa") sobre o teclado (seja da máquina datilográfica ou do meu notebook). Mas acontece que, bem como a misantropia, a resistência tecnológica dentro de mim é um ato, não um fato. Logo, permito-me às neo-condecorações.
No mais, para além do exposto, decidi também tomar uma certa consciência ecológica e poupar folhas de papel de pão, guardanapos, envelopes de correspondência e todas as outras superfices brancas e orgânicas que costumavam recepcionar minhas casuais angustias, ou rabiscos. Ora pois, deleito-me, agora, sobre o teclado e sobre a tela onde, ou para onde, pretendo transmitir de ofício meus "suspiros poéticos, sensações e descuidos". Além de meu sempre destorcido auto-retrato mudo. E, casualmente, de meu "despimento" infame e obscuro, ai de mim!

Carta ao estranho

Caro ex-estranho,
Não saberia dedicar outra coisa senão uma pausa de alguns (vagos) compassos ao instante desta, ora aquela, quarta-feira que trouxe de volta aquilo que, em verdade, nunca teve uma partida - sequer uma chegada. Digo, sim, da nossa amizade, ou ao menos do que a dupla abstração de nossas mentes projetou a respeito dela. Não pretendo chegar num ponto, considerado-se o estado de linha reta (aquela, "a descrição linear das coisas") em que tudo se encontra, ou se conta. Mas vou ao fato, já que este sim existe, de que o tempo, ora - o tempo, apresenta-se de diversas formas sendo delas a cronológica a que menos me atrai. E, ressalte-se, a que mais a mim trai. Donde surge qualquer coisa que me remete ao... tempo originário, para toda e qualquer concepção que se tenha a seu respeito.
Mas por fim, e de tudo isso a despeito, devo registrar que tudo certo quanto a possibilidade de um papo, um jazz e um fermentado. Sim, um fermentado. Porque quanto aos destilados, friso sim o meu apreço por eles, mas não apenas a eles. Os fermentados também encontram-se no meu hall de apreciação. A diferença, talvez gritante, entre uma coisa e outra, é que há várias maneiras de se tomar uma cerveja, mas apenas uma de se degustar um wisky (principalmente se você conseguir tragar um charuto imaginário e ouvir Coltrane dentro da vitrola existente no seu cerebelo) – mas este também não é o ponto. O ponto – além do conto – em questão foi o colocado há algum tempo “x” dum passado não muito remoto que conduziu ao lapso que proporcionou este re-conhecimento.
E, agora sim, cheguei n'algum exato momento. O (re) conhecimento e o (re) encontro que conduziram não só ao (re) estabelecimento de nossa nova velha amizade, mas também à criação desta página. Donde retiro que bem poderia ela chamar-se "crônicas a um desconhecido, ou ilustre estranho", mas preferi deixar assim, como tudo um tanto quanto im-pessoal. Já que, afinal, letra após letra, nossa amizade permanece, a mesma.
E, agora sim, por ora - é isso.