segunda-feira, 30 de novembro de 2009

A Fugitiva

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(ou qualquer um dos outros 06 títulos possíveis)
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"A Senhorita Albertina foi embora"
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Pouco menos de 45 dias, esta minha obsessão por Proust. As coisas acabam sempre fazendo sentido, numa hora ou n'outra. E neste momento, em específico, me sinto extremamente feliz (entra Tchaikowski com seu "Quebra Noses", pra ilustrar este momento tão único e singelo). Declaradamente me entreguei às sinestesias, redescobri o Violoncelo de Pessanha há cerca de dois meses e encrustrei-o na pele - as coisas sempre acabam fazendo sentido, numa hora ou n'outra.
Mas eu não ia falar de Pessanha, nem das sinestesias, tampouco do Violoncelo, apesar de estar mais dentro da esfera poético-musical do que nunca. Consegui, enfim, em fato e em ato unir a Poesia e a Música num só ofício em minha vida, pelo menos pelos próximos dois anos (ápice da valsa tchaikowskiana - eu poderia usar o termo técnico, mas sinceramente não o sei - é que meu objeto atual é música popular brasileira, parodoxalmente atual e distante).
E então eu não ia falar de Pessanha, nem das sinestesias, nem do Violoncelo... Mas sim do meu momento atual, confuso e empírico, talvez isso explique um pouco minha obsessão por Proust. Algumas coisas aconteceram depois que pisei em território sulista. Dentre elas, o fato de descobrir o tão procurado livro do pequeno capítulo de sensações angustiantes que li certa vez em francês e jamais consegui descobrir a autoria (me poupei de dar crédito ao autor, excluindo as últimas folhas da foto-cópia pra pagar mais barato). Mas depois desatei uma corrida alucinante - sabe-se lá quantos dias à procura da obra. Para auxiliar-me na empreitada tive a doce colaboração do meu antigo amigo, inexistente leitor e atualmente sem uma posição específica em minha vida - o fato é que eu realmente gostaria que ele soubesse que descobri do capítulo a autoria. Mais que isso! Adquiri o livro. Edição antiga, como de praxe. Negociada, mais uma vez, na biblioteca para a qual já verti um sem número de "Códigos da Vinci" em troca de raríssimas edições de clássicos. Passo a aclarear as coisas. Eu procurei durante dias, meses, horas a fio na biblioteca e madrugadas (madrugadas?) a fio daquele meu amigo, especialista em buscas virtuais, para as quais eu tenho me rendido recentemente. Então um belo dia, no meu doce e pacato habitat natural de 8 mil habitantes, procuro Camus na biblioteca municipal e encontro apenas uma obra: "O Estrangeiro" (talvez Wagner caísse melhor nesse momento). Mas é claro! (e óbvio). Abri a primeira página e me tomou de volta aquela sensação angustiante de 2004/2005 em que cursei aulas breves de francês - era acabada a estória, da minha busca deseserada, na companhia agradável de meu amigo, pelas letras que deram início talvez à minha primeira consciência da angústia profunda (eu daria outro adjetivo, mas me falta sensibilidade para tanto, por ora).
Troquei-o, como outrora dito, e fui pra casa sorrindo de lado, cortando transeuntes para me "enfurnar" no meu quarto. Depois segui viagem... para o cerrado, depois para a "transamérica de áfricas utópicas", e por fim cheguei na Ilha, trazendo-o não na mala, mas no bolso - um excelente companheiro de travessia, diga-se de passagem.
O que isso tem a ver com Proust?
Não sei. Talvez com a minha constatação atávica de que as coisas demoram um tanto pra chegar a consciência. A não ser que o caminha seja inverso - da consciência para a nossa esfera sensível. Mas quando o caminho é o verso, por si só, ah (pausa de semibreve)... haja madrugada, lua, (ex)tragos, enfim.
Portanto diria que, embora tenha consciência do efeito letal do Proust no meu momento atual, não me sinto ápta para discorrer sobre tanto. Poderia até me precipitar e expressar simplesmente que me encontro atualmente perdida no poema de sete faces anterior a Drummond (meu amigo agora talvez sorrisse, com um ar de "apenas eu entendi"). A anagnórisis, hermatia e perepetéia têm me feito sentido como nunca, no movimento trágico desta minha leitura.
Mas acontece que as horas me chegam e é chegada também a hora de dar cabo à minha narrativa - introspectiva e egocêntrica. Culpa dessa minha mania de divagar sobre o espectro existencialista. Muito embora talvez aqui haja muito mais essência do que existência, em si. Ou talvez seja só a maresia entorpecente dessa travessia... em rio longo e cheio de fumaça, mas de diversas notas, sempre de diversas notas.
(Apoteose de meu Allegro em Si, Bemol).