segunda-feira, 14 de setembro de 2009

Do lirismo e da gravata

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(ou, sobre a meta-equação)
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Estive pensando, qualquer dia desses, sobre o prazer incomensurável que sinto em minhas aulas de história da música, das agora doces tardes de quarta-feira...A matéria é espetacular e a professora (se tudo correr bem, doravante orientadora) fantástica, os alunos interessantes e o material sonoro que descubro sem valor estimável. E então, durante uma aula sobre os “Chorinhos e Chorões”, pus-me a pensar na minha relação com a música. -
Presente em minha vida desde a placenta (bônus de todo filho de musicista) sinto a música correndo em minhas veias desde o despertar de minha consciência pra vida. A esta altura, inclusive, minha mãe já até havia trocado as aulas de corda pelo cotidiano de ponto expediente (e pelo casamento, pelas filhas et coetera). Para minha alegria, anos antes de eu assumir minha paixão pela música, pelo amor ou pela dor minha mãe retomou seu ofício (sem casamento e com filhos crescidos, mas esse é só um detalhe). Evidentemente achei belíssimo! Tanto quanto hoje manifesto o meu horror ao ponto expediente – como as coisas mudam. Com 0 06 anos de idade, quando passava a tarde nos ensaios dos concertos de minha mãe, passava o dia todo decorando os termos tão belos da Constituição (- as coisas realmente mudam). Hoje, nas aulas sobre a constituição, me distraio (e des-traio) com um joguinho de notas bem divertido, que pode traçado resumidamente em “tom tom semi-tom tom tom tom semi-tom”- pra toda e qualquer escala. Mas isto não é uma auto-biografia; e nem haveria de ser. Passemos então a falar da minha relação fisiológica com a música, enfim.
Nunca gostei de estudar teoria! Regra geral, de nenhum tipo. Tomem que meu professor supremo de gramática foi Machado de Assis, ora pois. Também assim se deu com a música. Seguindo a máxima de que “em casa de pedreiro o espeto é de pau”, nunca fiz aulas de música com minha mãe, sequer quaisquer reles retiradas de dúvida. Aprendi, por culpa do maldito ponto expediente, a brincar com o violão bem cedo, antes de completar minha primeira década: tentava decorar o caminho dos dedos de minha mãe nos encontros de amigos e família e depois repetia no quarto. Um misto de amor e curiosidade. A falta de menção à técnica não é proposital – é fática!
E penso que assim é que se dá, com quase tudo na vida. Aprende-se a ler, lendo.. a tocar, tocando.. a escrever escrevendo.. ou amando.
(síncopa)
Peço, por gentileza, aos Senhores que não procedam à uma conotação caramelada da frase anterior. O verbo, como diria Clarice, “chora piegas”, bem sei. Mas há que se considerá-lo em todas as suas acepções, concepções e contextos. E é outra coisa que se faz quando se está no palco? Amar é um instinto, creio. Ama-se sempre, sabe-se lá o quê! O importante é apreender da sensação o devaneio, a mola propulsora da arte. No mais, traz algo do tipo Carlos Drumond de Andrade, “Eu não queria dizer, mas essa lua, mas esse conhaque...”, enfim.
(risos) - Conversa de boteco (com o), às cinco e meia da tarde de uma sexta-feira em que eu vou dar aula até às onze da noite.
A síntese é que entre encontros frequentes e uma centenas de textos (que pela primeira vez me aparecem simultaneamente obrigatórios e úteis) esta aproximação com a música tem me feito bem. Tanto minha rotina quanto meu verbo se tornaram menos ácidos (Ao que pergunto - E isso é bom?), sob a pena de uma quase insuportável pessoalidade. Por falar nela, e em razão dela, não pretendo me estender aqui - dormi pouco e apesar de não sentir nenhum sono preciso digerir em silêncio o DVD de um show que assisti ontem e que duas ou três palavras de um encontro casual me fizeram enxergar deveras melhor do que até então. É bom não ter de pesquisar jurisprudência para criar um juízo de valor a respeito de uma obra - e do contrário senti-la assim.. sentindo. A mecânica (líquida, livre e volátil) é a mesma do início. O bom é ser substância, mas eu ia dizendo que odeio a pessoalidade. Abaixo à primeira pessoa! Dizia ela (sobre a equação):
"A gravata, realmente, sufoca e constrange o pescoço. Mas são essas doses insuportáveis de lirismo que causam sempre qualquer desesperado nó na garganta".1
1. Ela, a gravata.