terça-feira, 17 de agosto de 2010

A menina que não é de Lá...

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(ou Guimarães proteja a minha meta-fora)
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Se a distância era também para lá necessária, tão além ou aquém do nosso espaço comum, não haveria de causar tamanho desconforto...
_ Foi a frase na qual eu quis crer, com a força de uma ou duas inversões sintáticas nobres.
Mas para o que me incomodava, de fato, não havia alopatia linguística.
(Homeopatia estava fora dos meus planos - eu sabia que precisava de medidas urgentes).
Dois ou três versos lançados numa noite estranha. E não é que disso tudo nasceu um poema?
Inútil, do ponto de vista pragmático da minha angústia.
E ridículo... reforçando em mim a sensação de que o Pessoa tem sempre razão
("todas as cartas de amor são blábláblá...).
Mas não era uma carta de amor. E na verdade talvez não fosse nada.
Quem sabe a consequencia de estar mal disposto, coisa de quem é pego pela metafísica numa madugada sem o menor resquício de cacau ou nicotina.
Mas se havia, de fato, metafísica, a minha maior certeza naquele momento é de que não havia meta-física alguma.
Talvez alguma metáfora. Seguida de metas-fora muito mais insistentes.
Aliás, tão insistentes quanto inúteis, como também o foi o poema.
Um dos versos, que contrariando o texto como um todo não me pareceu inútil, veio do menino que mora longe -
Lá onde o rio seca dos dois lados, e deixa no meio preso o meu barco.
O menino cuja retórica tem se impregnado em minha pele ultimamente.
O mesmo da tal melodia doce, que me fez nunca mais esquecer aquela voz.
Mas o que eu precisava mesmo acreditar é que em algum momento, como sempre foi de costume, algumas duas ou três páginas escritas me trariam paz de espírito.
Cheguei a arriscar um "...(derrogado)..." -
Graças à materialidade das reticências consegui poupar mais uma retórica inútil
(e fernandopessoanamente ridícula).
Depois me lembrei, enfim, que aquele nome de lá remonta a uma corredeira salgada talvez distante da minha -
Que desce o Rio...
O Rio que sempre foi minha metáfora, diga-se de passagem.
E diga-se sobre a passagem que se eu tivesse a graça de lá ser lançada cuidaria de me desfazer dos remos, pelo prazer de permanecer à deriva.
À deriva naquela travessia serena, recordando o menino que pitava um palheiro e torcendo pra não ter restado num barco de madeira burra.
Mas a essência de tudo vinha da certeza maior de que a irremediável razão do Pessoa não me trazia alívio, embora operasse um certo consolo.
Ao que eu quis, enfim, me livrar daquela narrativa longa e encravadamente impregnada.
Pra conseguir não voltar mais a essa história do Rio...
Que seca dos dois lados, e deixa no meio preso o meu barco.
[Auto-retrato nu, em inversão de pop art.
Enquanto a publicação for uma faculdade, meu baú de desescritos se fará cada vez mais farto.
E eu continuarei seguindo, na tentativa de me livrar daquela narrativa tão incisivamente impregnada.
E seguirei, continuamente, resistindo...
À tentação de promover a junção da minha tão irresignada
META-FORA].

quarta-feira, 4 de agosto de 2010

Sobre a marginalidade obsoleta

[...]
Ele gosta de poesia marginal...
Eu queria ter nascido em Cordisburgo
E nem gosto do Carpinejar.
Eu acho “buriti” palavra bonita,
Ele usa o vocabulário da noite, que também é minha
Mas onde é, enfim, que a gente se desencontra?
É que a minha finesse é descaradamente inferior à dele,
Mas o voto feminino é recente,
O que se há de fazer?
Eu só queria saber o que ele pensa
Sobre meninas com cabelo intacto e sorriso imóvel
As meninas para as quais um espelho
Vale mais que uma boa dose de vinho barato
(e dá o dobro do porre!)
Mas é que ele gosta de poesia marginal...
E eu, com meu âmago antiquado, fico pensando
Na minha marginalidade obsoleta.
Depois, quando cogito, enfim, afogar em ácido sulfúrico
As meninas de sorriso imóvel e cabelo intacto
Com o último lançamento do Dan Braw e o produtor musical da banda Restart -
Eu penso nele.
Será que ele salvaria alguma coisa?
Talvez ele goste de convenções e então salvasse as meninas
Talvez ele seja mais ligado a elas (às convenções) do que eu
Apesar de ele gostar de poesia marginal,
Apesar do meu eu obsoleto.
É que ele vive na marginalidade
E existe algo de heróico, completando essa profecia.
Aliás, eu bem que nos penduraria numa montagem do Hélio Oiticica
De alguma instalação em tropicolor, marginaliamente heróica.
Ele vestiria um parangolé e subiria numa estátua de Cristo
Encenando um Meteorango Kid.
E eu correria o sertão a cavalo...
Tentando descobrir entre Deus e o diabo onde é que fica
A minha terra do Sol.
Então, depois de algum tempo nessa travessia,
Eu desceria vinte mil léguas sertão abaixo
Pra tentar encontrá-lo num boteco da Augusta, ou da Consolação
(Por que não em Taguatinga?)
Ele estaria lá, na mesa do canto, compondo poemas... Marginal.
E eu chegaria a cavalo, cheia de vocábulos bregas,
Brindaria com ele um vermute
E continuaria não gostando do Carpinejar.